quarta-feira, 27 de maio de 2009

O contencioso pré-contratual - o trabalho escrito


Caríssimos,

Em seguida publicamos o trabalho que apresentámos em sede da aula de contencioso administrativo, no dia 8 de Maio de 2009. Em virtude de não ser possível publicar os slides de power point no blogue, optámos por colocar todo o trabalho escrito.

Esperamos que vos seja útil e proveitoso.

Cumprimentos, saudações académicas e cibernéticas,

Andreia Restolho, Kari Markkus e Sara Cristo e Silva


Introdução
A marcha da justiça não acompanha a rapidez da vida moderna. Nessa medida, o tempo judicial pode obstar à realização da justiça em tempo útil. Uma das formas de tentar contrariar essa disfunção temporal é acelerar o tempo judicial quando as circunstâncias da vida reclamam uma justiça rápida.

Origem do nome “contencioso pré-contratual”
Esta designação é deduzida da expressão “actos pré-contratuais”, correntemente utilizada para qualificar os actos administrativos praticados durante os procedimentos de formação de contratos, de direito público ou direito privado, que são celebrados pela administração pública.

Enquadramento Histórico - Antecedentes e Razão de ser
Pressionado pelas instâncias comunitárias, pouco satisfeitas com um sistema contencioso pré-contratual que, na prática, não tinha qualquer eficácia, pois as decisões judiciais relevantes apenas eram tomadas muito tempo depois de os contratos celebrados com base nos actos impugnados estarem a ser executados (e, sobretudo, nos reflexos que a situação tinha na concorrência entre empresas da União Europeia), o Governo publicou o DL nº134/98, de 15 de Maio, estabelecendo um contencioso dos actos pré-contratuais mais ágil.
Este diploma transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva nº 89/665/CEE do Conselho de 21 de Dezembro e a Directiva nº 92/13/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro, mais conhecidas como “Directivas Recursos”, que procederam à harmonização dos procedimentos a adoptar em matéria de recursos contenciosos no âmbito da celebração de contratos públicos de obras e de fornecimentos.
Essa exigência de um novo regime foi consagrada com a Reforma de 2003, sendo que tal matéria é actualmente tratada nos artigos 100º a 103º do Código do Procedimento de Tribunais Administrativos (doravante designado por CPTA).
O contencioso dos actos administrativos inseridos num procedimento administrativo, visando a outorga de um contrato com a administração pública, foi o derradeiro aspecto do contencioso administrativo, objecto das preocupações do legislador antes da reforma de 2003, com a Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro.
O objectivo do novo regime, à semelhança do que já sucedia anteriormente, é procurar garantir que os particulares envolvidos em procedimentos de contratação pública, alegadamente lesados nos seus direitos e interesses legítimos por comportamentos das entidades públicas que conduzam tais procedimentos, tenham à sua disposição instrumentos processuais eficazes e céleres.
As adaptações ao regime do anterior Decreto-Lei nº 134/98 já tinham sido, em parte, antecipadas com a revisão efectuada com a Lei nº 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, as quais se traduzem, no essencial, na extensão do âmbito de aplicação do contencioso pré-contratual aos contratos de concessão de obras públicas, bem como, à impugnação das terminações contidas nos próprios documentos conformadores do concurso público (Art.º 100 nº1 e 2), no alargamento para um mês do prazo para a impugnação contenciosa, (Art.º 101º) - anteriormente o prazo era de 15 dias - e na inovadora introdução da possibilidade de o tribunal, oficiosamente ou a requerimento das partes, optar pela realização de uma audiência pública sobre a matéria de facto e de direito, em que as alegações finais são proferidas por forma oral e no termo das quais será imediatamente ditada a sentença. (Art.º 103º).

Processos Urgentes. O que são?
São mecanismos de resolução célere e flexível dos conflitos, assim designados por constituírem quatro formas especiais de processo, legalmente instituídas em razão da urgência na obtenção de uma pronúncia sobre o mérito da causa por forma mais célere do que a que resulta da tramitação normal.

Processos Urgentes. Quais são?
• Contencioso Eleitoral – art. 36ºnº1 a) e art.97º ao 99º CPTA;
• Contencioso pré-contratual – art. 36 nº1 b) e art.100º ao 103º CPTA;
• Intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões – art. 36º nº1 c) e art. 104º ao 108º CPTA;
• Intimação para protecção de Direitos, Liberdades, Garantias – art. 36º nº1 d) e Art.109º ao 111º CPTA.

Impugnações urgentes - razão de ser
São processos nos quais está em causa, essencialmente, a verificação da legalidade de pronúncias da administração.
As sentenças, nestes processos, não se referem somente à invalidade dos actos impugnados, mas também ao pedido de condenação directa da administração.

Impugnações urgentes – finalidade
Este processo autónomo e urgente resulta da necessidade de salvaguardar simultaneamente dois interesses, tanto públicos como privados, que são:
- Promover a transparência e a concorrência, com a protecção adequada, aos interesses dos candidatos à celebração de contratos com as entidades públicas;
- Garantir a estabilidade dos contratos da administração, depois de celebrados, dando protecção adequada aos interesses públicos substanciais em causa e aos interesses dos contratantes.

Razões justificativas para a existência de processos urgentes:
1. Estão em causa direitos fundamentais das pessoas - constituem direitos fundamentais de todos os cidadãos, o direito a um processo célere e prioritário, face ao disposto no art. 20º nº 5 da Lei Fundamental, da Constituição da República Portuguesa, bem como uma tutela jurisdicional dos direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses mesmos direitos ou interesses, assim como, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma.
Além de que é também garantida aos cidadãos administrados a determinação da prática de actos administrativos, legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas, atento o nº4 do art. 268º da CRP.
Ser garantida aos cidadãos administrados a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas (cfr. art. 268º nº4 C.R.P.) - o litígio surge no desenvolvimento de um percurso que ainda não terminou e que não pode ser interrompido por muito tempo – é o caso dos actos administrativos relativos à formação de certos contratos da administração pública.
Acresce que se corre o risco de a lenta marcha da justiça inutilizar a tutela judicial pretendida.

Enquadramento legislativo do Contencioso Administrativo pré-contratual
Na legislação anterior verificava-se uma identificação tendencial entre processos urgentes, meios processuais acessórios e tutela cautelar.
A presente lei distingue claramente entre processos urgentes – em que a causa da urgência não radica na intenção cautelar, mas na necessidade de, considerados outros factores, apressar a decisão judicial – e processos cautelares – em que está em causa a intenção de prevenir a ocorrência ou o agravamento dos danos, em resultado da previsível demora do processo judicial, principal razão da urgência.
Primeiro ponto a focar
O primeiro aspecto a sublinhar relativamente a este meio processual é que ele não se aplica a todos os contratos da administração pública: somente pode ser utilizado no âmbito de procedimentos administrativos tendentes à celebração de contratos de empreitada e de concessão de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens, cfr. artigo 100º nº1 do CPTA.
Além de que, também, não só os actos primários, mas os actos secundários, (exemplo: um acto de anulação do procedimento pré-contratual ou de revogação da adjudicação) são impugnáveis através do referido meio processual.
Relativamente às impugnações urgentes, estas devem ser aplicadas, quer para o efeito da impugnação de actos administrativos de conteúdo positivo, quer para o efeito de reacção contra actos negativos ou situações de inércia administrativa dirigida à condenação da prática de actos devidos.
Em rigor, a necessidade de assegurar a existência de um meio processual expedito, com vista a salvaguardar o princípio da concorrência, no âmbito dos contratos públicos, tanto ocorre em relação a actos positivos, como a actos negativos, pelo que representaria um claro decréscimo de efectividade de tutela jurisdicional se o meio processual concebido para satisfazer o interesse da urgência no domínio do contencioso pré-contratual apenas abrangesse parte dos litígios pré-contratuais que, a esse nível, se podem suscitar.
A impugnação de actos administrativos não deve entender-se, somente, como um meio impugnatório, mas também como um meio de condenação à prática de actos administrativos.
Outra questão que se tem levantado é o da cumulação de pedidos, sendo que a lei permite (remissão para a acção especial) a cumulação do pedido de anulação do acto pré-contratual, com o pedido de condenação à sua substituição por outro acto que não reincida nas ilegalidades cometidas, de reconstituição e de anulação do contrato, entre outros, cfr. art. 47º CPTA.
Quanto à questão da cumulação de pedidos tem surgido alguma problemática, que levou à existência de doutrina divergente, sendo que:
Para alguns autores, como José Carlos Vieira de Andrade, não é admissível a cumulação do pedido de anulação com o pedido de condenação, de reconstituição e de anulação do contrato, entre outros.
Por outro lado, existem autores, como Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, que defendem que nada obsta a que seja pedida e concedida a condenação, ou seja, não afastam a possibilidade de cumulação de pedidos, sendo que a cumulação, num contexto de urgência pode justificar-se plenamente, seja nos casos em que exista omissão, indeferimento ou recusa ilegal de contratar (no caso da impugnação dos actos negativos); seja no caso de impugnação de actos positivos, de exclusão de propostas ou de concorrentes, pois também nesses casos pode haver interesse na condenação.
Para estes autores é possível cumular com o pedido de anulação do acto de conteúdo positivo, o pedido de condenação à substituição desse acto por outro que não incorra nas mesmas ilegalidades, em relação aos actos compreendidos no art. 100º nº1, já que tanto o art. 4º como o art. 5º, todos do CPTA, não estabelecem qualquer restrição a este propósito.
Deste modo, resulta, do já referido art. 5º nº1, que a circunstância de aos pedidos cumulados corresponderem outras formas de processo não obsta à cumulação de pedidos em processos urgentes, havendo, nessa altura, que seguir a forma da acção administrativa especial com as adaptações que se revelem necessárias, já que o artigo 102º CPTA estabelece desde logo que os processos do contencioso pré-contratual seguem a tramitação da acção administrativa especial com diversas adaptações que a tornaram mais célere.
Havendo cumulação de outros pedidos, ter-se-á que ponderar se a cumulação é de modo a justificar uma desaceleração do processo, fazendo com que o mesmo corra termos que, no todo ou em parte, se afastem do modelo mais célere que resulta do art.102º CPTA para se aproximarem do modelo normal a que obedecem os processos não urgentes.
Estes autores também defendem que a mera cumulação no processo impugnatório do pedido de condenação da administração à substituição do acto impugnado por outro que não reincida nos mesmos vícios não parece sequer justificar essa desaceleração, uma vez que as indagações a realizar, incidiram em qualquer caso sobre os mesmos factos para o efeito da aplicação das mesmas normas. No seguimento desta ideia, o mesmo dizem quanto à cumulação da impugnação do acto pré-contratual com a impugnação do próprio contrato, visto que o art. 102ºnº4 CPTA admite expressamente que possa ter lugar a título superveniente, sem associar a isso quaisquer consequências de tramitação.
No entanto, os mesmos defendem que a cumulação de um pedido de reparação de danos, na medida em que o justifique a necessidade de indagação sobre as consequências danosas da ilegalidade cometida, já poderá justificar a eventual desaceleração do processo.
Pelo supra exposto os autores concluem que caberá naturalmente ao juiz proceder à necessária ponderação a esse respeito, ouvidas as partes com a máxima brevidade, conforme prevê o art. 5º CPTA.
Segundo ponto a focar
Este meio processual urgente aplica-se não só aos actos administrativos relativos à formação dos contratos em sentido próprio – a exclusão de um concorrente, a adjudicação do contrato, etc. – mas também ao programa do concurso, ao caderno de encargos e a qualquer outro documento conformador do procedimento de formação daqueles contratos, designadamente com fundamento na “ilegalidade” das especificações técnicas, económicas ou financeiras, cfr. art. 100º nº2 CPTA.
Terceiro ponto a focar
O contencioso pré-contratual aplica-se aos contratos celebrados pelos organismos de direito público, na acepção lata escolhida pelo Direito Comunitário, nos quais se incluem não só o Estado, as Regiões Autónomas, as Autarquias Locais, os Institutos Públicos e as Associações Públicas, como todas aquelas pessoas colectivas de natureza não empresarial que, independentemente da sua qualificação oficial, obedeçam a certos requisitos objectivos, como:
• sejam financiadas maioritariamente pelo Estado ou por outros Entes Públicos;
• se encontrem sujeitas a controlo de gestão por parte destes últimos;
• ou cujos órgãos de direcção ou fiscalização sejam, em mais de metade, designados por essas mesmas entidades públicas.
No que respeita aos contratos de empreitada, de prestação de serviços e de fornecimento nos sectores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações, encontram-se igualmente abrangidas pelo contencioso pré-contratual as entidades que, operando nessas áreas, se caracterizem como organismos de direito público ou como empresas públicas, entendendo-se como tais quaisquer empresas em relação às quais os poderes públicos possam exercer directa ou indirectamente, uma influência dominante, em virtude da propriedade, da participação financeira e das normas que são aplicáveis.

Competência
A referência do nº3 do art. 100º a sujeitos privados, interpretada em conjugação com a do art. 4º nº1 e) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (doravante designado por ETAF), reforça o entendimento que os Tribunais Administrativos são os competentes para conhecer da impugnação de actos pré-contratuais praticados por pessoas colectivas privadas, quando tais entidades se encontrem sujeitas a uma disciplina procedimental de direito público.
Quando o autor do acto impugnado seja um dos incluídos na enumeração da alínea a) do nº1 do art. 24º do ETAF, o tribunal competente é o Supremo Tribunal Administrativo; sendo que os Tribunais Administrativos de Círculo são competentes nos restantes casos, cfr. art.º 44º ETAF.

Legitimidade
A legitimidade activa pertence a quem se sentir lesado pelo acto administrativo pré-contratual (art.º 9º, com remissão para o art.º 55. n.º1 a), art.º 73º n.º2, por indicação expressa do art.º 100º n.º1 CPTA)
A legitimidade passiva pertence à entidade pública ou ao Ministério, no âmbito do qual tiver sido praticado o acto (art.º 10º, por remissão do art.º 100º n.º3 CPTA)
Nestes processos existem quase sempre procedimentos administrativos de concorrência.
Logo, o pedido deve ser dirigido também contra os outros envolvidos no procedimento pré-contratual, ou seja, contra pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor, cfr. dispõe o art.º 10º do CPTA.

Oportunidade
O prazo para a utilização deste meio processual é de um mês, contado da notificação do acto aos interessados ou, se esta não existir, do seu conhecimento, nos termos do art. 101º do CPTA.
No caso de uma impugnação administrativa necessária, no caso de omissão de uma decisão administrativa, sobre essa impugnação, o prazo é igual a um mês, a partir do termo do prazo legal para a decisão.
Refira-se ainda que os prazos processuais correm em férias judiciais, cfr. art.º 36º n.º2 CPTA e que, no caso dos recursos, o prazo de interposição é de 15 dias e estes sobem imediatamente, cfr. art.º 147º CPTA.
O prazo de um mês previsto no art.º 101º CPTA entra em disputa com os prazos gerais de impugnação de actos e normas (art.º 58º n.º2 CPTA), que é de um ano para o Ministério Público e de 3 meses para qualquer interessado.
A questão que tem levantado mais problemática quanto à aplicação dos prazos é de saber se esse prazo previsto em sede do contencioso pré-contratual se trata de um meio processual de utilização necessário ou de um meio processual alternativo, cuja não utilização não impede a impugnação contenciosa através da forma comum, prevista nos art.ºs 37º e seguintes do CPTA.
Alguma doutrina entende que, dado o carácter necessário e urgente do contencioso pré-contratual, o prazo de impugnação previsto no art.º 101º do CPTA prevalece sobre os demais, incluindo a inexistência de prazo para impugnação de normas, sendo porém omissa quanto à impugnabilidade a todo o tempo dos actos nulos.
Relativamente a alguma jurisprudência, a mesma tem entendido que o prazo previsto no art.º 101º CPTA não é imperativo e não se impõe aos demais, designadamente à impugnação dos actos nulos, cfr. art.º 58º n.º1 do CPTA, admitindo assim a impugnação sucessiva através do meio processual comum, quando o acto pré-contratual se encontre viciado de nulidade ou inexistência jurídica. Porém, outra parte da jurisprudência tem entendido que o único meio processual admissível é o previsto no contencioso pré-contratual, independentemente do tipo de vícios que possam afectar o acto impugnado. No entanto, recentemente, tem existido uma inclinação da jurisprudência em considerar que o art.º 101º do referido diploma consagra um regime especial que não contempla qualquer excepção e, como tal, o prazo aí previsto torna-se aplicável quer a actos meramente anuláveis, quer a actos nulos.
Outra celeuma que tem surgido quanto à especificidade do contencioso pré-contratual é de que esta não colide com o regime geral da invalidade dos actos administrativos, como é previsto nos art.ºs 133º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (doravante designado por CPA). Ora, os actos nulos, quando proferidos no procedimento pré-contratual, mantêm a sua característica de inaptidão intrínseca para a produção de quaisquer efeitos jurídicos, com as consequências que lhe são próprias, designadamente no plano da invocabilidade a todo o tempo, por qualquer interessado, de acordo com o previsto no art.º 134º n.º 2 do CPA. No entanto, decorre, do n.º3 do mesmo artigo, que a declaração de nulidade não prejudica a salvaguarda das situações de facto criadas ao abrigo dos actos nulos por simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito, acabando por se concluir nesse sentido que o prazo previsto no art.º 101º do CPTA não se aplica às situações de nulidade ou de inexistência, em que a impugnação não está sujeita a prazo. Ainda quanto ao regime da anulabilidade e dos actos anuláveis há que referir o disposto nos art.ºs 135º, 136º com remissão para o artigo 141º, todos do CPTA, que nos diz que o acto administrativo anulável, cujos actos anuláveis são aqueles que ofendam princípios ou normas jurídicas, são susceptíveis de impugnação perante os tribunais, sendo que tal acto administrativo anulável pode ser revogado com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida. No entanto, não podemos deixar de focar que prevê o n.º 2 do art.º 141º daquele diploma que, caso existam diferentes prazos para o recurso contencioso, deverá atender-se ao prazo que terminar em último lugar.
É nosso entendimento que o pedido de declaração de nulidade ou anulação do acto terá de ser naturalmente deduzido na causa principal a instaurar nos termos do artº 100º do CPTA. Com efeito, a finalidade do regime dos arts. 100º a 103º do mesmo diploma é fundamentalmente a de salvaguardar os interesses públicos prosseguidos pelos contratos para cuja celebração tendem os procedimentos no decurso dos quais os actos impugnados foram praticados, bem como os interesses privados dos interessados nesse procedimento, em face da maior demora que decorreria da utilização de um meio processual mais complexo, sem carácter urgente, e por estas razões sujeito a prazos mais longos. Assim, o meio processual dos arts 100º a 103º do CPTA é de utilização necessária e não uma alternativa à acção administrativa especial.
Já no que concerne ao regime relativo ao prazo de impugnação há que fazer a conjugação das disposições gerais dos art.ºs 59º e 60º do CPTA, a que são subsidiariamente aplicáveis o art.º 100º n.º1 do mesmo diploma, havendo assim lugar à suspensão do prazo de impugnação por efeito da utilização dos meios de impugnação administrativa, previstos no art.º 59º n.º1 daquele diploma, bem como à interrupção desse prazo no caso de um interessado requerer o suprimento de notificação ou publicação deficientes, assim como à aplicação do regime de inoponibilidade da notificação ou da publicação, de acordo com o condicionalismo previsto no art.º 60º n.ºs 1 e 2 daquele texto legal. Relativamente ao que se refere no descrito no art.º 69º n.º3 do CPTA, a suspensão do prazo opera em relação aos actos de indeferimento e não já às situações de inércia, pelo que, independentemente da interposição de impugnação administrativa, o prazo para a reacção jurisdicional conta-se desde o decurso do prazo fixado na lei para a decisão de 1º grau.

Tramitação
Estes pedidos de impugnação seguem os trâmites do modelo da acção administrativa especial (cfr. art.º 46º e segs. CPTA), com algumas particularidades decorrentes da natureza urgente do processo, cfr. art.º 102º nº1 do CPTA, tais como:
a) A restrição da faculdade de alegar, aos casos em que haja sido produzida ou requerida prova juntamente com a contestação, conforme prevê o art.º 102º nº2 CPTA;
b) O encurtamento de vários prazos, conforme prevê o art.º 102º nº3 CPTA;
c) A faculdade de o juiz optar, por iniciativa própria ou a requerimento de qualquer das partes, pela realização de uma audiência pública sobre a matéria de facto e de direito, na qual, para mais rápida solução do caso, as alegações das partes serão orais, sendo a sentença ditada imediatamente após o termo da audiência, conforme prevê o art. 103º do CPTA;
d) A admissibilidade da modificação objectiva da instância pode ocorrer em dois casos distintos:
I – O primeiro corresponde à ampliação do objecto da impugnação ao próprio contrato, na medida em que esta pode ser a única forma de conceder tutela judicial adequada e suficiente ao autor, atento o disposto no art. 102º nº4 do CPTA com remissão para o art.º 63º, ambos do CPTA;
II – O segundo caso ocorre quando, no decurso do processo judicial o tribunal verificar que existe uma impossibilidade absoluta de satisfazer os interesses do autor, atento o disposto no art.º 102º nº5 com remissão para art.º 45º, ambos do CPTA.
Exemplo:
O autor havia sido preterido ilegalmente na adjudicação do contrato, mas a prestação do contraente privado consistia no fornecimento de uma certa quantidade de um bem consumível, que já foi fornecido pelo adjudicatário e consumido.
Numa situação como a supra descrita, o Tribunal, colocado perante a impossibilidade absoluta de satisfazer o pedido do autor, como o direito impunha, transforma o pedido de impugnação num pedido de indemnização pelos prejuízos causados ao autor em resultado do acto impugnado, tentando que as partes cheguem a acordo sobre o montante da indemnização, atento o disposto no art.º 102º nº5 CPTA.
No caso de tal acordo não ser obtido, caberá ao Tribunal fixar o montante de indemnização, atento o disposto no art.º 45º nºs 3 e 4 CPTA.

Conclusão
Existe actualmente uma tendência comunitária para a unidade/unificação do direito da contratação administrativa, que é visível também a nível nacional, no que se refere aos aspectos substantivos como aos do procedimento ou de processo, que se denotou com a entrada em vigor da Lei n.º4-A/2003.
O que anteriormente se entendia como um poder de supremacia da Administração Pública relativamente aos contratos por esta celebrados, no sentido de esta ser dotada de poderes especiais no domínio dos contratos administrativos, que exigiam um regime jurídico específico, contrapunha-se aos contratos de direito privado da Administração, onde o regime jurídico era semelhante ao de qualquer outro contrato, sendo que, em caso de litígio, tal era da competência dos tribunais comuns, em oposição ao que sucedia nos contratos administrativos em que, em caso de litígio, a competência cabia aos tribunais administrativos.
Assim, foi consagrada a competência da jurisdição administrativa para todos os contratos celebrados no âmbito da função administrativa, para além de ter sido instituído um contencioso de plena jurisdição, tanto em termos de meios principais, como de providências cautelares, assim como um processo urgente específico do contencioso pré-contratual.
Deste modo, obtém-se a resolução directa das situações controvertidas relativas à legalidade procedimental dos contratos em momento anterior à da sua celebração, evitando-se assim impugnações a posteriori baseadas nesses fundamentos.
Logo, o contencioso pré-contratual não tinha qualquer autonomia processual, sendo a tutela jurisdicional assegurada pelo recurso contencioso de anulação e pela impugnação de normas.
Com a reforma de 2003, o contencioso pré-contratual ganhou autonomia própria no CPTA, sendo o único procedimento administrativo com consagração expressa na lei adjectiva.
Os processos urgentes impugnatórios são uma inovação no novo contencioso administrativo, na medida em que são processos que visam a obtenção de uma decisão de mérito, num curto espaço de tempo.
O contencioso pré – contratual, com traços comuns à figura do referé précontratuel do contencioso francês, sendo um processo urgente, regulado nos art.ºs 100º a 103º do CPTA, consagra um contencioso de plena jurisdição, respeitante aos litígios emergentes das relações contratuais administrativas especificadas em sede desses artigos.
A efectividade da tutela exige providências urgentes, que não pertencem ao domínio da tutela cautelar, pois só podem ser proferidas num processo de fundo, claramente dirigido a proporcionar uma tutela final, que impenda sobre a relação jurídico-administrativa e com carácter de urgência, dada a celeridade com que se impõe alcançar a justa composição de interesses públicos e privados envolvidos.

Crítica
O legislador, em 2003, deveria ter ido mais além na reforma efectuada com a entrada em vigor da Lei 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, pois o regime do contencioso pré-contratual deveria ter sido alargado a outros actos e contratos celebrados no âmbito da função administrativa e não se ter restringido somente aos que se encontram expressamente consagrados no art.º 100º n.º1 CPTA, de forma a obter na sua plenitude uma acção administrativa mais célere e eficaz, como por exemplo relativamente aos actos respeitantes à concessão da exploração dos jogos de fortuna e azar. Anteriormente fazia-se esta crítica também relativamente à concessão de serviços públicos e concessões de exploração de uso privativo do domínio público, tendo o legislador resolvido este problema com a entrada em vigor do Código dos Contratos Públicos (Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro).
Assim a crítica actual a fazer é de que o regime previsto no art.º 100º a 103º do CPTA deveria ser alargado à generalidade dos contratos para que todos possam beneficiar de celeridade e eficácia.

Acórdãos relevantes
• Acórdão do STA (Pleno) de 12/12/2006 no Processo 528/06
-problemática:
Urgência e invalidade dos actos administrativos pré-contratuais.
• Acórdão do STA de 14/12/2005 no Processo 905/05
-problemática:
Conduta incompatível do acto administrativo de anulação do procedimento contratual com a subsistência do acto de adjudicação.
• Acórdão proferido pela 1ª secção do S.T.A. em 03/09/2003 no Processo 1392/03
-problemática:
Aplicabilidade do contencioso Administrativo pré-contratual como processo urgente.

Bibliografia
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-Almeida, Mário Aroso de, O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2007.
-Andrade, José Carlos Vieira de, A Justiça Administrativa (lições), Almedina, 2007.
Silva, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise - Ensaio sobre as Acções no Novo Processo Administrativo, Almedina, 2005.
-Fonseca, Isabel Celeste M., Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (Função e Estrutura), Lex, 2004.
-Dias, Paulo Linhares, O Contencioso Pré-Contratual no Código de Processo nos Tribunais Administrativos in Revista da Ordem dos Advogados, Setembro 2007, Ano 67.
-Gonçalves, Pedro, Contencioso Administrativo Pré-Contratual, Cadernos de Justiça Administrativa n.º 44, Março/Abril 2004.
-Gonçalves, Pedro, Avaliação do Regime Jurídico do Contencioso Pré-Contratual Urgente, Cadernos de Justiça Administrativa n.º 62, Março/Abril 2007.
-Matos, André Salgado de, Contencioso Pré-Contratual Urgente e Invalidade dos Actos Administrativos Pré-Contratuais, Cadernos de Justiça Administrativa n.º 62, Março/Abril 2007.
-Nunes, Mesquita Adolfo, A Urgência no Contencioso Pré-Contratual, in Tese, constante do Arquivo da Biblioteca da Faculdade de Direito de Lisboa, 2008.
-Nunes, Mesquita Adolfo, O Processo Urgente de Contencioso Pré-Contratual no Novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos, in Tese, constante do Arquivo da Biblioteca da Faculdade de Direito de Lisboa, 2003.
-Seringa, Maria Manuela Justino, Âmbito do Contencioso Administrativo Pré-Contratual, in Tese, constante do Arquivo da Biblioteca da Faculdade de Direito de Lisboa, 2007.

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